A PRINCESA – PARTE 02

Fiquei petrificada, paralisada qualquer coisa que faça você entender que
por alguns segundos eu fiquei sem ar.

– PUTA QUE PARIU. NÃO É POSSÍVEL.

– Miga, você ficou com a princesa do Brasil! – Me virei para Paloma e tampei a boca dela.

– Cala boca, fala baixo pelo amor de Deus!

– Tá estressada? Não deveria!

– Não deveria? NÃO DEVERIA!?

– Agora é você que está gritando.

– Ela mentiu para mim! Ela mentiu… Até o nome dela ela mentiu.

– Mas, é claro, se ela é quem está aparecendo na TV. Se ela falasse, Oi eu sou a princesa Maria, filha do rei e estou aqui na roda de samba. Você iria acreditar?

– Não… Mas não me interessa. – Desliguei a TV

– Ei, poxa eu estava vendo!

POV MARIA

– Foi uma bela cerimônia. – Disse, me sentando na poltrona.

– Realmente. – Minha mãe concordou.

– Estamos liberados? Preciso dormir. – Questionei olhando para o rei.

– Não dormiu bem essa noite ? – Ele perguntou intrigado.

– Não, tive insônia.

– Lamento. Os compromissos acabaram, pode ir Carlos, acompanhe minha filha.

– Sim, majestade.

Saímos com forte esquema de segurança, quando finalmente ficamos sozinhos

– Vou ligar para ela.

– Para a moça de ontem? – Carlos perguntou curioso.

– Sim! Ligarei.

– Pegarei um celular provisório, princesa.

– Não, usarei o meu mesmo. – Ele ficou assustado.

– É perigoso, princesa, alguém ter seu número de telefone.

– Eu sei, mas, creio que ela não me fará mal.

– Sendo assim, lhe deixarei a vontade. – Ele saiu andando. – Se o rei perguntar de ti, digo que?

– Que já estou repousando.

– Certo, bom descanso princesa, qualquer coisa, estarei por perto.

– Obrigada, Carlos.

Peguei meu telefone, e disquei seu número. Com muita demora, fui atendida.

– Alô?

– Alô, gostaria de falar com Priscila.

– Quem é?

– Oi… Sou Julia, nos falamos em uma roda de samba na comunidade. Você me deu seu número, se lembra?

– Julia ou Princesa Maria? – Senti meu coração parar de funcionar, senti a raiva carregada em sua fala. – Vamos princesa, devo me curvar por telefone?

– Priscila, sinto que está chateada comigo, me desculpe, eu não tinha intenção se magoa-la.

– Você mentiu para mim, eu detesto mentira! Quer dizer,  vossa excelência não deve saber o que é ser um ser humano de bem.

– Sinto muito, foi preciso.

– Foi preciso porquê? Eu não lhe passei confiança?

– Claro que me passou, Priscila, senão nem teria ido com você para uma rua vazia no meio da noite, em uma comunidade.

– Você me usou, estava fazendo o que? Vendo como os pobres agem?

– Pare com isso, eu não fui pesquisar nada! Eu gostei de você de verdade.

– Com todo respeito, vossa alteza, sei que não tenho condições de lhe pedir nada, mas, por favor, esqueça que eu existo. – Ela desligou na minha cara.

POV PRISCILA

– Aí desliguei na cara dela. – Contei calmamente para Paloma.

– Estou chocada. Poxa, ela só queria conversar, não precisava ser tão rude.

– Sabe que detesto mentira, Paloma, ela mentiu e ponto. Que ela faça outra de idiota, não eu.

– Calma, vida que segue… Vamos ali na esquina comer um cachorro quente, e tomar um guaraná natural.

Três semanas depois.

Trabalhar no que não queria, já é ruim… Mas, atualmente tenho trabalho pensando nela, meu Deus eu beijei a princesa do país e porra, era para isso ser uma história bonita! Que merda.

– Pri, acorda, o rapaz quer pão. – Aline do outro lado do balcão me gritou.

– Desculpa, Aline… Desculpa, moço.

– Sem problemas.

– Quantos pães?

– Seis, de preferência, mais moreninhos.

– Só um minuto, moço. – Peguei os pães como ele pediu, embalei e entreguei. – Algo mais?

– Não obrigado.

– Eu que agradeço e desculpa minha demora ao atendê-lo.

– Imagina, está tudo ok. Valeu.

– Próximo! – Gritei enquanto arrumava os pães na cesta. – Quando me virei, era o primo, que na verdade não é primo de Julia, Maria… Enfim.

– Posso ajudá-lo? – Fingi não me abalar com sua presença.

– Dez pães, por favor. – Ele disse calmamente, me seguindo no balcão. – Ela quer lhe ver. – Disse baixinho.

– Quem é você, afinal? Príncipe de Mônaco?

– Carlos, sou guarda real, cuido da segurança da princesa.

– O que eu tinha que falar com ela, já foi dito.

– Eu insisto, fale com ela.

– Cara, seus pães já estão aqui. Quer mais alguma coisa? – Ele correu o rosto pelas prateleiras.

– Quero dois quilos de pão de queijo. – Ele disse rápido.

– Sério? – Revirei os olhos.

– Sim… Lamento que ela tenha te magoado, mas, após sua rejeição, ela anda tão cabisbaixa, tão quieta. Ela não é assim. Acredite, a princesa é uma pessoa muito legal, de um nobre coração, ela só mentiu o nome dela! Mas, aquela mulher que você se sentiu atraída, aquela mulher que você conversou por um longo tempo. Ela existe.

– Ela te mandou falar tudo isso?

– Ela não sabe que estou aqui.

– Porque está fazendo isso então?

– Porque acho que a princesa merece a chance de conversar com você, sem nenhum tipo de mentira ou omissão.

– Mais alguma coisa?

– Depende, se você concordar em vê-la, o pedido estará encerrado. Caso contrário, pedirei mais coisas, pedirei a padaria inteira, caso preciso.

– Que saco… tá bom. Quando? – Me rendi.

– Me passe seu número, marcarei o encontro. – Anotei em um pedaço de papel.

– Obrigado, senhorita. – Ele saiu sorridente carregando todas aquelas sacolas.

A noite, quando estava escovando os dentes para dormir, Carlos me mandou mensagem pelo whatsapp.Daqui dois dias, ele iria me buscar para uma visita ao palácio real.

Eu acho que nem tenho roupa para ir em um lugar como esse.
Contei apenas para Paloma, ela surtou. Me fez até comprar roupas novas. Optei por uma calça jeans não rasgada, admito que foi um sacrífico não comprar do jeito que estou sempre acostumada a usar.

POV MARIA

Meus pais viajaram para Portugal, com minha irmã. Ela insistiu para eu ir, mas Carlos insistiu para que eu ficasse, então fiquei, alegando que estava indisposta. O que não é de todo mal, eu estou sem disposição desde que falei com Priscila por telefone.

Bateram na porta.

– Princesa, com sua licença.

– Oi Carlos, queria falar comigo?

– Não, majestade… Não eu, mas tem alguém que eu trouxe para visitá-la.

Quando Priscila foi entrando pela porta do meu quarto quase não acreditei, eu estava toda a vontade, de short e blusa regata. Minha cara caiu no chão. Olhei para Carlos, ele sorria abertamente.

– Princesa. – Ela se curvou.

– Oi, Priscila. – Estiquei a mão para ela. – Não precisa se curvar eu, eu nem estou apresentável. – Olhei para Carlos. – Carlos, como?

– Depois te explico, bom, vou deixa-las a sós… Suponho que posso pedir para fazerem um jantar para vocês.

– Você quer ficar para jantar comigo? – Perguntei sem acreditar ainda que ela estava ali na minha frente.

– Será um prazer.

– Carlos, por favor, peça e depois quando estiver tudo pronto, me comunique.

– Sim, senhorita. Com licença. – Ele fechou a porta.

– Seu quarto é bem legal. Até simples para realeza.

– É… Meu quarto é legal. – Não conseguia formular uma frase que prestava, eu estava em choque.

– É do tamanho da casa onde moro… O que não sei definir, se minha casa que é pequena, ou seu quarto que é grande.

– Sente-se.

– Ok… Acho que te devo um pedido de desculpas, eu fui grossa com você por telefone, é que eu fico put. – Ela não terminou de falar.

– Puta? – Eu perguntei. – Não precisa controlar seu linguajar, pode se expressar como quiser, eu não ligo.

– Nossa, você deve ter se esforçado muito para não usar essas palavras e essa linguagem coloquial.

– É, eu fico… Ficava me policiando sim, mas, não consigo falar espontaneamente de outra forma. Quer beber algo? Posso pedir para trazerem o que você quiser.

– Não, eu estou bem. Obrigada, princesa.

– Pode me chamar de Maria.

– Agora entendo o porque de você ter ficado cismada quando te chamei de princesa, na hora você deve ter achado que tinha te reconhecido.

– É, eu achei que tinha me reconhecido mesmo. – Aquele momento constrangedor que uma não consegue olhar nos olhos da outra.

– Maria, me perdoa?

– Claro, talvez na sua posição eu tivesse agido da mesma forma. – Nos olhamos brevemente, mas, ela desviou o olhar para o lado.

– Que foto legal, é você?

– Sim, sou eu com a freira que cuidava de mim na Croácia.

– É um país bem longe.

– Sim, sinto saudades de lá.

– Porque voltou?

– O rei me obrigou, mas, lá eu tinha uma vida pacata… Tinha me casa, morava sozinha.

– Sozinha? Sem ninguém para limpar?

– Sim, só eu, sem nenhum serviçal.

– E prefere assim? Eu odeio limpar minha casa, mas, ajudo.

– Preferia assim. Quer ver algumas fotos de lá? Tenho caixas de fotos de lá.

– Claro! Quero sim.

Nos sentamos no chão e começamos a ver as fotos que tirei, ela parecia à vontade ali, meu medo é que ela estivesse ali obrigada.

Minutos depois.

– Princesa, o jantar está na mesa.

– Obrigada, Cinthia, já estamos indo. – Me levantei. – Vou guardar isso aqui, depois vemos mais, tudo bem?

– Sim, princesa.

– Priscila, por favor, sem formalidades… Tente esquecer que sou uma princesa.

– É meio que impossível, afinal, estou dentro do palácio real, olhando para você que bom, claramente é a princesa. E tem guardas reais por todos os lados… Tem coisas reais por todas as partes.

– Calma, com o tempo você acostuma, vamos jantar? Pedi para prepararem algo bem simples, espero que você goste. Me acompanha.

– Sim prin… – Olhei para ela, fingindo estar brava. Ela sorriu. – Sim, te acompanho, Maria.

– Bem melhor assim.



POV PRISCILA

– Quer mais sobremesa?

– Se eu comer mais alguma coisa, acho que explodo. – Caímos na risada.

– Se importa se eu comer mais? Adoro brigadeirão.

– Sinta-se em casa. – Eu disse fazendo Maria rir.

Agora as coisas estavam normais na minha ótica, mas, demorou, eu achei que essas mesas gigantes só existissem em filmes. Mas cá estou comendo em uma mesa com 80 cadeiras. Isso seria tão útil na comunidade.

Maria está sendo muito agradável, e notei que ela é assim com todos os funcionários, todos gostam muito dela. Ela brinca o tempo todo.

– Vamos dar um passeio pelo jardim? Assim conversaremos melhor.

– Claro.

– Então, quase tive uma síncope quando te vi. – Ela puxou assunto enquanto andávamos pelo jardim.

– Pois é, eu percebi. Mais uma vez, desculpa por ter desligado o telefone na sua cara.

– Tudo bem, eu lhe entendo, eu fiz algo que você odeia.

– Você sempre faz isso?

– Sair escondida para curtir a noite disfarçada? – Ela perguntou e afirmei com um gesto. – Sim, sempre faço. Carlos é mais do que meu guarda real, mais do que amigo, ele é meu cúmplice… Meu melhor amigo.

– Então existiu outras como eu.

– Não… Quer dizer, sim, já fiquei com outras mulheres, mas não aqui no Brasil, nunca fiquei quando saía escondido.

– Porque sai escondido? Aposto que é bem mais fácil entrar nos lugares quando sabem quem você é.

– Porque eu amo o povo brasileiro, amo a alegria deles… E adoro observar pessoas, e parece mais fácil para mim pelo menos, ter uma conversa sincera e agradável de primeira, com quem não sabe quem eu realmente sou, a que família pertenço.

– Porque eu?

– Não sei, mas algo aqui dentro implorava para te procurar. Estranho não é? – Ela parou de andar.

– É… E cá estamos.

– Gostou da minha casa?

– Sim, é linda, mais linda do que nas fotos que já vi.

– Sobre o que disse do rei… – Maria disse curiosa.

– Eu sei, eu devo pedir desculpas. – Despejei rapidamente.

– Não, tudo bem… Eu só queria saber porque disse aquelas coisas.

– Talvez seja porque você não vive a minha rotina, mas, não quero estragar esse passeio.

– Não me entenda mal. – Ela segurou em meu braço. – Eu estou me contendo para não te beijar, te agarrar aqui agora. – Seu rosto ficou vermelho. – Mas, eu também quero saber o que acontece lá fora que eu não sei.

– Muitas coisas acontecem lá fora.

– Me conte, me informe. Me preocupo com meu povo, não quero ser como as princesas que existem por ai, que só pensam em festas e futilidades.

– Gostei do que ouvi.  Não espera pelo príncipe encantado?

– Não, espero ser a princesa encantada de alguém. – Ficamos em silêncio, Maria é muito doce e gentil, mas, naquele momento seus olhos se fixaram no meu, demonstrando audácia, meu corpo se esquentou, ela continuou segurando meu braço. – Seu telefone está tocando Priscila.

– Han? Que? Há, desculpa eu nem ouvi. – Comecei a procurá-lo em minha bolsa. – É minha melhor amiga, Paloma. Depois retorno.

– Por favor atenda, ela deve estar preocupada.

– Oi.

– Miga sua louca. – Paloma gritou do outro lado da linha, na verdade ela só fala gritando. Pela cara da Maria, ela conseguia ouvir e segurava o riso.

– Eu estou aqui ainda, depois te ligo, Paloma.

– AI MEU DEUS! A PRINCESA ESTÁ AI POR PERTO… DEIXA EU FALAR COM ELA.

– Não Paloma.

– QUAL É SAPINHA!? DEIXA EU FALAR COM A PRINCESA.

– Não, já falei que não. – Maria, estava rindo, me fez um sinal para entregar o celular em suas mãos. – Não precisa ela vai encher você.

– Alô, Paloma?

– MEU DEUS, É A PRINCESA?

– Sim, sou eu mesma, prazer em falar com você, tudo bem? – Maria se sentou em um banco do jardim.

– Estou ótima, alteza.

– Por favor, sem formalidades agora. Priscila falou muito bem de você.

– SÉRIO? GRAÇAS A DEUS, ESSA VACA NUNCA FALA BEM DE MIM. – Quis morrer, ela me chamou de vaca para a princesa. Cadê a noção?

– Sim, ela falou bem de você… Quando vou te conhecer pessoalmente?

– MEU DEUS, VOCÊ QUER ME CONHECER?

– Sim! Claro! Vamos combinar ok?

– Claro, princesa.

– Paloma, porque o apelido da Priscila é sapo? Escutei você falando.

-Hum… É recente.

– Porque?

– Por nada, não. – Interrompi a ligação tentando recuperar o telefone.

– Vamos, me diga porque? – Maria se esquivou.

– ELA VAI ME MATAR, MAS VOU FALAR… EU A CHAMO DE SAPO, PORQUE É SAPO QUE BEIJA PRINCESA. – Neste momento eu queria cavar um buraco naquele jardim imenso e sumir. Maria não parava de rir junto com Paloma ao telefone.

– Entendi… gostei de você, é engraçada. Mas vou devolver o telefone para ela e fique tranquila que mais tarde sua amiga também será entregue.

– Tudo bem, fique o tempo que quiser, princesa.

– Até mais.

– Até.

– Toma… Sapo. – Maria me entregou o telefone rindo.

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