Improvável – Parte 4

POV MAYA

– Parabéns, idiota! – Ouvi a voz de Lucy e me virei de imediato, estava com medo dela, afinal no estúdio ela disse que levaria um ovo para jogar em mim. – Tá com medo, não é sua puta? – Ela deu uma risada divertida. – Vim de mãos limpas! – Nos abraçamos. – Parabéns cabeça de vento, tudo de bom pra você.

– Valeu, vadia. – É assim que nos tratávamos carinhosamente, eu sou a puta e ela a vadia. – Gostando do som?

– Muito! Esse DJ manda bem, está cheio de imprensa lá na entrada, provavelmente agora que eu entrei devem estar fazendo matérias sensacionalistas sobre como nos amamos. – Caímos na risada.

– Pois é! Imprensa… Uma faca de dois gumes, são essenciais para divulgação do nosso trabalho, mas um pé no saco para a vida pessoal.

– Pois é, ninguém merece… Já encontrei seu irmão.

– Até você já encontrou ele e eu não!

– Já disse que vocês dois são os gêmeos mais desconexos que eu conheço?

– Como assim?

– Ah, sei lá, tem aquele lance de gêmeos sentirem as mesmas coisas… Vocês não são assim!

– Não mesmo, eu gosto de mulher e ele de homem.

– Palhaça! – Ela deu um tapa no meu ombro. – Tá acompanhada por quem dessa mesa? Cadê seu cão de guarda?

– Não fala assim… A ubi está no banheiro dando uns pegas em alguma garota… E eu, bom, posso estar enganada mas acho que essas duas que estão aqui atrás de mim, me querem.

– Humm. – Lucy deu uma conferida. – Qual a novidade? As duas são lindas… Vai ganhar ménage de presente de niver?

– Espero que sim.

– Você não presta! Imagina se eu realmente fosse apaixonada por você como a imprensa diz? Eu iria sofrer muito!

– C’est la vie! – Pisquei para ela que na hora mostrou a língua para mim. – Me diga, onde está meu irmão?

– Descubra! Use os poderes dessa parada de gêmeos. – Fechei a cara fingindo irritação. – Ok, ele está ou estava, no piso de baixo conversando com duas garotas simpáticas.

– Uma delas deve ser a famosa Julia, amiga dele.

– Sim! Tinha uma Julia com ele

– Vou até eles, vem comigo?

– Não, acabei de sair de lá… Vou me juntar com o pessoal da série, ok?

– Beleza.

Sai em direção do segundo piso, em busca de Marco. Fui parada algumas vezes por amigos querendo uma breve conversa. Finalmente avistei meu irmão perto de uma pilastra conversando animadamente com duas mulheres, uma de saia preta e blusa branca, com cabelos amarrados em um coque.
A outra usava uma calça jeans de cintura alta e uma blusa vermelha… Cabelos loiros no ombro e um batom vermelho que deixava tudo mais sensual… Uma gordinha linda.

– Parabéns para o cara mais bonito do mundo! – Abracei meu irmão por trás.

– Parabéns para nós, meu amor! E você só fala isso porque sou sua versão masculina.

– Exatamente! – Dei um selinho no meu irmão. – Te amo muito!

– Eu também! – Ficamos em um abraço apertado por um bom tempo. – Maya, te apresentar… Essa aqui é a Cindy. – A moça abriu um sorriso e me abraçou rapidamente.

– Feliz aniversário, Maya.

– Obrigada, linda! Muito prazer em conhecer você.

– E essa aqui, é a Julia. – Meu irmão colocou uma de suas mãos no ombro da moça de batom vermelho.

– Julia? – Aquela mulher olhou para mim com uma cara séria, esticou suas mãos para que eu apertasse.

– Sim, Julia Oliveira… Feliz aniversário, senhorita Montreal.

– Pode me chamar de Maya se quiser. – Ela parecia não ir muito com a minha cara.

– Prefiro chamá-la assim, se não se importa.

– Como preferir…  – Ela tentou desfazer o contato de nossas mãos, porem eu continuei a segurá-la. – Você é muito famosa em minha casa, meu irmão vive falando de você, fala muito bem!

– Marco é muito gentil e doce… Um pouco exagerado nos elogios.

– Sou nada! – Meu irmão quebrou aquele clima não muito amistoso. – É verdade! Julia é incrível!

– Aposto que sim. – Julia conseguiu soltar nossas mãos. – Eu estou no piso superior com alguns amigos, lá tem sofás e é até mais confortável do que vocês três em pé aqui.

– Ótimo, vamos. – Marco segurou na mão de Julia e saiu arrastando.

Meu irmão se divertiu muito, cantamos parabéns com um bolo gigante feito nas cores da bandeira gay. Eu estava bem acompanhada por duas mulheres lindas e gostosas que volta e meia me diziam bobagens em meu ouvido e apertavam minhas coxas por debaixo da mesa. Mas eu não estava focada nelas ou em toda putaria que aconteceria depois.

Eu olhava Julia, eu só queria olhar para ela. Tão sorridente e gentil com meu irmão e com as pessoas em nossa volta, mas quando nossos olhares se cruzavam ela fechava o semblante. Tentei puxar pela memória se nos conhecíamos de algum lugar, talvez eu fiz ou falei algo em outra ocasião, mas eu não me lembrava.

– Tô afim daquela amiga do seu irmão. – Rubi me chamou em um canto.

– JULIA? – Eu realmente levei um susto com essa hipótese.

– A gordinha? Tá louca? Eu não fico com gordas… Nem você, não é?

– Bom, eu nunca fiquei.

– Ótimo. – Rubi bebeu mais um pouco de vodka. – Falo da Cindy, gostosa ela!

– Ah… – Fiquei aliviada, não sei o porque, mas eu fiquei aliviada.

– Ei, se você quiser ela, pode ficar. É teu niver… Fora que você viu ela primeiro.

– Não, não! Eu não quero a Cindy… Pode ficar, digo, se ela quiser.

– E me diga uma coisa. – Ela passou seu braço em volta do meu ombro. – Já teve alguma mulher que me disse não?

– Não… Não conheço.

– Exatamente. – Rubi abriu um sorriso e saiu.

Voltei para meu lugar e Julia não estava mais ali, corri com meus olhos pela multidão e finalmente encontrei-a dançando com meu irmão.
Julia… Julia Oliveira.

POV JULIA

Admito, estou curtindo a festa… Estava curtindo mais quando Marco estava perto, o namorado dele apareceu fazendo uma linda surpresa. Obviamente os dois saíram daqui para curtir a noite sozinhos. Cindy caiu nos encantos da Rubi, ela até que é bem legal… Sinto por ela ser amiga da Maya.

Maya… Não podia ter tido pior primeira impressão dela, se acha a gostosa. É atrevida e ainda vive me encarando, provavelmente julgando meu corpo. Essas pessoas famosas que cultuam o corpo magro, enfim… Aquela coisa de padrões de beleza que sempre me tira do sério.

Cindy disse que voltava daqui meia hora… Já se passaram uma hora e nada dela ou da tal Rubi.
Tem um monte de gente ao meu lado, mas, tecnicamente estou sozinha.
Maya bebeu demais, e não para de dançar como uma louca. Até as duas mulheres que estavam com ela, desistiram dela… Eu nunca ví uma pessoa tão bêbada!

Resolvi ir para a casa, já era quase quatro da manhã e Cindy não apareceu.

No estacionamento para meu desprazer, lá estava ela tentando abrir a porta do carro, como alguém tão bêbada poderia pensar na hipótese de dirigir? Resolvi buscar ajuda.

– Senhorita Montreal.

– JULIA! – Maya gritou meu nome e me deu um abraço apertado. – Adorei te conhecer! Gostou da festa?

– Sim. – Me desfiz do abraço e a encostei no carro. – Cadê Rubi? – Ela fez um bico e um sinal com as mãos que mostrava que ela não sabia. – Ok… Vou chamar um taxi para te levar para a casa, eu tô sem bateria e a boate já fechou.

– Minha bateria morreu! – Ela jogou o celular em minha direção, realmente o celular dela está sem bateria.

– Merda! Não posso deixar você dirigir, vai provocar um acidente. Vem, vou te levar para a casa. – Dei minha mão para ela, mas ela me puxou para mais perto.

– Eu te acho linda, Julia.

– Você nem ia gostar de saber o que acho de você… Agora para de palhaçada, se apoia em mim, meu carro é aquele ali. – Andamos até meu carro  e com muita dificuldade chegamos. – Senta ai e faz o favor de ficar quieta!

– SIM, SENHORA!

O caminho até a casa dela não podia ter sido mais desastroso, ela não parava de cantar, e ela não canta nada bem. Fora as vezes que ela tentou tirar minhas mãos do volante para “pilotar o carro”. Finalmente chegamos na casa dela, tranquei-a no carro e toquei a campainha, demorou um tempo, mas o pai dela apareceu.

– Bom dia, senhor Montreal

– Bom dia, quem é você? Quem deu permissão de entrar no condomínio?

– Eu trouxe sua filha…

– Maya?

– Sim, ela está dentro do carro, está bem bêbada. Eu sou amiga do seu filho, só sobrou eu para trazê-la… O senhor pode me ajudar a tira-la do carro?

– Claro! – O senhor Montreal parece ser uma boa pessoa, caminhou comigo até o carro e lá estava a “filhinha dele” com o meu óculos nas mãos! Meu óculos predileto! Meu óculos da sorte! – Filha, vamos para casa.

– PAI! OLHA SÓ QUE EU ACHEI! – Maya levantou o óculos como quem levantava um troféu, e depois colocou no rosto. –  ESTOU COM CARA DE NERD?

– Está filha. Agora, vamos… Meu Deus, Maya! Nunca ví você tão bêbada assim!

– Bebi só um pouquinho! – Maya tirou o óculos do rosto e quebrou. Sim ,ela quebrou o meu óculos. – Opa!

– Eu não acredito! Você quebrou meu óculos!

– Desculpe, minha filha.

– Não! Era meu óculos predileto! – Liguei o carro com toda raiva, querendo sair dessa situação infernal.

– Calma ai. – Maya conseguiu parar em pé sem a ajuda do pai, segurou na lateral do meu carro e colocou sua cabeça pela janela. – Me descul.. – A imprestável não conseguiu terminar a frase, vomitou tudo o que tinha dentro dela ali, diante dos meus olhos no banco de passageiro do meu carro. Seu pai veio correndo tirá-la, mas já não dava mais tempo. – Desculpa.

Assim que o pai dela a tirou de dentro do meu carro, não esperei pra ver o que poderia acontecer, arranquei com o carro de lá morrendo de nervosismo. Parei em um posto, deixei o carro nas mãos de dois funcionários e pedir para eles limparem tudo!

Dois dias depois…

– Bom dia, flor do dia! – Marco entrou na sala todo feliz.

– E ai, Marco. – Cumprimentei-o e continuei a cuidar de um cãozinho.

– Nossa! Que desanimo!

– Cansada apenas.

– Amiga, foi o melhor aniversário da minha vida!

– Feliz por você… Ele já voltou para o Japão?

– Sim. Ele literalmente fugiu para me ver!

– Romântico isso. – Continuei a cuidar do animal.

– Minha irmã quer te ver. – Ele disse esperando que eu surtasse, mas apenas ignorei. – Ah qual é, Maya está se sentindo muito mal pelas coisas que meu pai contou pra ela.

– Que ela vá se sentir mal no inferno! Eu não quero ver sua irmã nem pintada de ouro! Eu peguei uma raiva tão grande dela que eu não vou assistir nem mais a serie!

– Mas você limpou o carro…

– Claro! Você acha o que? Que eu iria deixar o vômito dela lá? Entrei no primeiro posto que eu vi na minha frente.

– Olha amiga, esse óculos também ficou lindo em você.

– Mas eu gostava daquele! Aquele foi o primeiro óculos que minha mãe teve em toda sua vida, e ela me deu ele, aquela armação era mais do que uma simples armação, é o objeto que me fazia sentir próxima a minha mãe.

– Eu sinto muito.
POV MAYA

Duas semanas depois…

Se uma coisa agora eu tenho certeza, é que a amiga do Marco realmente está brava comigo. Também não era pra menos, só que eu não estou acostumada com isso. Nesse mundo de fama, não importa o erro ou a gafe que eu cometia, eu sempre era perdoada, porque as pessoas me mimam para eu ficar perto delas.
O fato é que eu quero pedir desculpas pessoalmente a ela, e sei que ela não iria ao meu encontro, pensei em aparecer na faculdade dela, mas isso causaria tumulto e ainda a deixaria mais brava comigo.

Então, cá estou em uma bela casa, no condomínio mais caro de Miami esperando uma corretora de imóveis aparecer. Eu dei uma pesquisada na corretora onde ela trabalha, eles atuam no mercado de Miami faz pouco tempo em vista das outras, porém a reputação deles é excelente.

Quando um imóvel custa mais do que 2 milhões geralmente, não vem um corretor qualquer, vem o dono da imobiliária. Espero que essa informação seja verídica, porque eu realmente estou pensando em sair da casa dos meus pais. Seria unir o útil ao agradável.

Fiquei dentro do carro esperando a corretora, e para minha alegria e ao mesmo tempo pânico, era ela, o carro dela… Julia.

Quando ela saiu do carro eu também sai do meu.

– Ah, não! – A reação dela me fez rir. – Tá rindo de que?

– Da sua cara ao me ver.

– O que você quer? – Ela cruzou os braços.

– Ver a casa!

– Ah meu Deus, isso é um pesadelo! – Julia olhava para o céu como quem quisesse ser ouvida por Deus.

– Nem adianta tentar falar com Deus, porque não é. – Abri minha bolsa e tirei o papel que comprovava que eu era a pessoa que estava interessada na casa. – Tá ai o papel… Dê o visto por favor.

– Ok. – Ela pegou o papel das minhas mãos com certa rapidez e deu o visto. – Vamos com isso logo.

 

Continua..

 

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Parte 2 

Parte 3

Parte 5

assinatura paula okamura.fw

Celine Ramos
Baiana, feminista, negra e publicitária. Fundadora do SouBetina. Vivo na ponte-aérea Salvador-São Paulo. <3